November 27, 2009

Mudanças


Mudar é um pretérito imperfeito do subjuntivo. Regular, conjugado como fácil, mudar é verbo enigmático. Logo a primeira pessoa do presente do indicativo é o estranho mudo. Eu mudo é vago e silencioso. Mudo de casa para ficar mais perto da possibilidade de ser feliz. Não tenho certeza, apenas mudo. Se estou mudo fico em silêncio esperando que minha mudança mude o meu silêncio e o meu sorriso. Tudo parece estar em permanente mudança. Mudam os dias no calendário, mudam as horas e o tempo passa mudando tudo a sua volta. E, ainda assim, permaneço mudo diante dessas mudanças que não mudam a minha dor. Plus ça change, plus c’est la même chose.

“É temerário investigar o desconhecido; mais temerário, porém, é pôr em dúvida aquilo que se conhece”. – Kaspar. A epígrafe é certeira, flecha precisa.

Dias e noites buscando palavras que traduzam os sentimentos incertos. Palavras leves, cruas, tenras, ditas pela manhã, com o frescor da manhã. Nada harmônico, tudo sangue escorrendo pelas pernas e a bunda pousando suavemente no prato grande, cheio de leite. Esse parágrafo será objeto de assepsia tão pronto a empresa responsável pelos serviços mande alguém. Acionamos as empresas e elas nos fornecem os serviços para a mudança. Os serviçais, os empregados domésticos, os prestadores de serviço avulso, todos eles orquestrados para fazer a mudança. E quando tudo fica pronto fica também claro que nada foi alterado.


O outro mundo não importa. A política, a economia, a cultura, os destinos da humanidade: nada disso importa. Apenas o que sonho no meu sono sem acordos com o mundo. Nunca fico de acordo ou acordado num estado de vigília obedecendo às ordens de ficar atento e desperto para os acordos feitos na calada da noite, na madrugada dos meus sonhos.


Sonho que subo correndo a montanha. Resvalo em pedras mas alcanço o abrigo próximo
e interrompo a descida para o abismo. O suor corre pelo rosto, desce pela ladeira íngreme, pelo corpo tenso, banhado em energia e desejo. É em você quem penso seguindo esse caminho. Lá, no alto, quem sabe, verei tua fantasmagoria.

Os dias correm. Subo essa montanha todos os dias da minha vida. É nela que guardo minhas esperanças e desfaço meus sonhos. As palavras são as esperanças e os sonhos são fantasias povoadas de palavras. Não tenho nada além desse corpo organismo com poros abertos e atentos, marcado pelo desejo de subir cada vez mais alto, de estar cada vez mais próximo.

Corro para ti. Para dentro do teu corpo aberto em carne e suores, líquida existência que flutua na minha boca. As partes moles, leves, vermelhas, moradas, pelos suaves, macios, dobrados, repuxados e doces.


Subo correndo a montanha. Resvalo em pedras mas alcanço.
Nunca me canso, esse é sempre o pouso do meu encanto.